Oficinas recuperam relíquias no túnel do tempo

by | dez 6, 2020

Se algum dia você pensar em adquirir um carro antigo e ele estiver com a aparência de ferro velho imprestável, não desanime. Existem em São Paulo algumas oficinas especializadas, verdadeiras máquinas do tempo, que se encarregarão de transformá-lo em obra digna de museu. Para isso, além de paciência, é necessário ter muito dinheiro. Antes de mais nada esqueça o verbo reformar. Um veículo antigo deve ser restaurado por mão-de-obra capacitada em devolver-lhe a originalidade.   

”Não importam as condições  em que o carro chega até aqui, nós o entregamos como ele era, o mais próximo possível de suas características originais de fábrica”, afirma Fernando Rossi, 41, proprietário da Magneto Restaurações, uma das maiores oficinas especializadas em carros antigos de São Paulo. Lá são restaurados quaisquer tipo de veículos, nacionais ou estrangeiros, mas nos seus quase dez anos de existência, a oficina voltou-se principalmente para os chamados carros clássicos, fabricados até a década de 30.

Na Magneto hoje preciosidades sendo restauradas, como um Rolls-Royce 1921, que ainda mantém as garrafas de cristal para bebidas e os frascos de perfume originais, além de quatro Isotta Fraschini, todas da década de 20. Contando com essas quatro, há apenas seis  em todo o Brasil, o que dá uma idéia da raridade desses modelos e da conseqüente responsabilidade dos funcionários que trabalharão sobre essas verdadeiras representações materiais da história da  motorização.

Preço elevado

Esta super-especialização pode ser explicada pelo preço da restauração. Os proprietários levam para a oficina um carro que mereça os Cz$ 200,00 hora/homem cobrado pela Magneto e pelas demais oficinas no gênero. O pagamento é quinzenal mas o carro pode permanecer de seis meses a dois anos no processo de restauração.

Como explica Rafael Lebre, 38, um dos proprietários da Garage Voisin, outra oficina que só trabalha com veículos clássicos, ” a restauração pode ficar bem mais cara do que o preço pago pelo veículo, em alguns casos, dependendo do estado do carro, ela pode superar em três vezes o preço da compra ”. Mesmo assim, os proprietários dessas oficinas dizem que o trabalho não é muito lucrativo. Assim como os donos dos carros, eles se consideram idealistas por realizar um serviço artesanal, e afirmam que pagam salários acima da média do mercado.

O processo de restauração é o mesmo para todos os veículos antigos. O carro é desmontado e as diversas partes são agrupadas pelas suas especificações: funilaria, bancos e estofamento, parte elétrica e mecânica. Em todos os casos as oficinas utilizam ferramental da época ou até fabricam ferramentas especiais. Para conseguir uma perfeição de fábrica no veículo, as oficinas dispõem de bibliotecas repletas de livros que contam as história das indústrias, catálogos que  de cor de tapeçaria e manuais de oficina da época, material que é usado como referência para se chegar ao formato correto de um detalhe, obter uma pintura fiel ao modelo original etc. É a partir dessa pesquisa que os restauradores desenham as peças e a lataria e chegam até a realizar moldes em gesso ou fibra de vidro para ter uma idéia precisa dos diversos componentes, antes da montagem.

Nos carros clássicos, – como um Chrysler Royal Cabriolet de 33, por exemplo – a estrutura da carroceria é toda de madeira, revestida com chapas de metal aparafusadas ou rebitadas. A madeira, na grande maioria dos casos, é fortemente atacada pelo cupim e no metal, como é hoje, o problema é a ferrugem. Para um ângulo perfeito, as duas partes são refeitas em conjunto e depois montadas. 

Os defeitos do motor exigem esforços mais complexos, uma vez que as peças não são fabricadas no Brasil. Muita coisa é refeita nas próprias oficinas, mas outras peças que necessitam de tornos de alta precisão, como anéis, pistão, bielas e engrenagens de câmbios, por exemplo, são recomendadas nas firmas especializadas.

No exterior, muitas dessas peças ainda são fabricadas mas poucas oficinas optam pela importação. ”;Chegamos a importar válvulas da Inglaterra para nossos carros, que lá custam o equivalente a 12 dólares cada uma, para trazê-las para cá; com os elevados custos de importação, o preço triplicou”, diz Richard Slynn, 38, da ReE Restaurações, oficina que se especializou em carros ingleses e recentemente restaurou um MG modelo TC de 1948, propriedade do publicitário Mauro Salles.

Já Luís Francisco Baptista, 47 , dono das oficinas Agromotor, prefere refazer do que importar. Além dos dez anos de experiência nesse trabalho, ajudou na opção o fato de ele ter dirigido seu serviço para carros das décadas de 40 a 60, principalmente da linha Ford, como os Mercurys, Thunderbirds e Mustangs, que têm peças mais fáceis de serem conseguidas.

Mas no caso dos pneus todos são unânimes : só comprando no exterior. E alguns componentes simplesmente não existem mais, como as colméias celulares do radiador. Há ainda alguns serviços que são executados por firmas especializadas ( leia texto abaixo), como cromação dos pára-choques e maçanetas e também o corte especiais dos vidros.

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